26 de ago. de 2014

ST Warlock - O Inicio (1)

Note: This article is available in english HERE.

Hoje eu gostaria de falar sobre um projeto muito especial para mim: a guitarra que eu sonho em construir e ter desde antes de aprender a tocar guitarra (há uma década atrás). É um projeto extremamente complexo, conceitual e desafiador em cada detalhe.
Quando eu digo "detalhe" eu falo sobre o fato dela rodar um sistema operacional escrito para ela para extensivo controle MIDI e sobre ter um captador reenrolado com uma bobina adicional para funcionar como sustainer e, também, sobre a parte elétrica analógica ter sido projetada e construída por mim. Até o case dela será especialmente feito com uma inovação tecnológica.É um projeto muito especial para mim e eu convido-os a acompanhar o seu desenrolar.


Agradecimentos:
O tempo também me apresentou algumas pessoas que vêm sendo atenciosas e dedicadas ao ouvir as minhas ideias e ao considerá-las uma possibilidade, ao invés de um delírio. Pessoas que, além disso, demonstraram entusiasmo e colaboraram com a criação de todo o material necessário para completar um projeto muito maior que eu.
O principal agradecimento vai ao Erik Zatti (o responsável insubstituível pela manutenção, regulagem e modificação das minhas 6 guitarras e construção da 7º: a definitiva!) por já ter passado 2 ou 3 vezes na mesma semana na minha casa para ouvir mais sobre as minhas ideias, pegar peças feitas por mim, retornar para sua oficina e executar tudo conforme o plano, retornando com tudo feito na exata descrição feita por mim, com a meticulosidade e perfeição esperada de um profissional sério.

Hardware:
Começando a "desmontar" a ideia, o hardware é a parte mais comum. Tarrachas lock tuner para estabilidade, trastes de inox para durabilidade e conforto e uma ponte tune-o-matic com piezo-saddles (talvez a parte menos comum). Isso possibilita a captura da vibração das cordas por meios mecânicos (como ocorre em um violão) ao invés de elétricos. Tem uma demonstração do som de uma dessas sem nenhum processamento adicional no vídeo ao lado.

Captador de ponte:


Na posição da ponte, escolhi os HDN da Entwistle, uma empresa do Reino Unido (ainda sem distribuidores no Brasil) que eu descobri por acaso e me interessei em conhecer esse pickup que usava imãs de neodímio bem mais fortes que os cerâmicos.
A teoria é a seguinte: enrolamentos maiores produzem mais tensão de saída, por isso captadores vintage tem 5-7K e captadores hi-gain chegam aos 20K. O custo disso é um aumento na capacitância, que em conjunto com a indutância e resistência, desvia o pico de ressonância do pickup para um ponto mais grave e ocasiona o "roll-off" de agudos em uma frequência mais baixa. Esse é um dos motivos de pickups vintage soarem mais agudos e o motivo pelo qual eles soam mais "macios" conforme os anos é a carga magnética começar a diminuir e afetar a resposta. Se o campo aumentar, adivinha?
Imãs de neodímio poderiam permitir a confecção de um captador com um campo magnético mais forte do que os cerâmicos, elevando novamente a frequência de ressonância e diminuindo a perda de agudos, mesmo com uma bobina maior.
Resultado: Captadores de alta (leia-se ALTA) saída articulados e cristalinos. Eu já havia comprado um e o uso na ST Weaver (a guitarra da foto ao lado) e nesse link tem um vídeo para quem quiser conferir o timbre.




Captador de braço:
Eu já havia tido experiências com captadores nacionais. Vendi os humbuckers que deram lugar ao HDN na ST Weaver, mas curti e mantive um set Dallas na ST Nevan.
Como leitor assíduo e admirador do trabalho da Paula Bifulco e do Paulo May, eu tive uma sensação muito positiva de tentar um Sergio Rosar nesse projeto. Ao ver as análises de curva de resposta e dados bem documentados dos mesmos, me convenci. Entrei em contato e peguei dois modelos: o Virtual Active e o PunchBucker (ambos na
posição braço) para  modificar para "captador + sustainer" e testar.

Sustainer:

Aqui deixo mais um agradecimento: dessa vez ao Sr. Sergio Rosar, que foi super atencioso ouvindo sobre o design da peça e, uma vez não podendo me atender em uma fabricação artesanal por motivos bem compreensíveis, me tirou algumas dúvidas e manifestou suas opiniões. Além de uma quantia do seu vasto  conhecimento e experiência na área, o Sr Rosar aceitou me fornecer dois de seus captadores: um PunchBucker e um VirtualActive, ambos com um dos carretéis desligado dos contatos na base e mais acessível para realizar a tarefa de enrolar a terceira bobina do driver do sustainer (que eu fotografei e pode ser visto ao lado).
Se você lê o blog, sabe que eu já escrevi um artigo sobre o funcionamento do sustainer. Sugiro a leitura do mesmo se você quer entender o que eu estou fazendo aqui. Apesar de já ter enrolado algumas unidades, eu nunca fiz um "sustainer + captador", e, apesar de teoricamente funcionar e algumas pessoas terem feito o mesmo com sucesso, depois dos testes, pretendo escrever um novo artigo entitulado "Sustainer, faça o seu", cujo objetivo está bem explícito no título. Espero que gostem.

Parte elétrica (analógica):
Vou separar a eletrônica da guitarra para facilitar. Temos 2 controles individuais de volume para captadores de ponte e braço e uma chave seletora comum. O controle de volume do piezo não passa pela seletora: só adiciona seu sinal ao captador selecionado na saída principal. Esse controle não interfere na saída direta: um segundo sinal fica disponível para gravação/mesa, mesmo que o volume do piezo esteja fechado na guitarra.
Um quarto potenciômetro controla a quantidade de sinal enviado para a bobina do driver do Sustainer no captador do braço. A ideia, aqui, é ir desde um sustain leve e orgânico até uma realimentação eletromagnética digna do Tom Morello com o ajuste no máximo.
Eu não costumo usar controle de tonalidade passivo (que corta agudos) na guitarra por motivos que eu relatarei em outro artigo. Na verdade, eu até construí um circuito para expandir médios-agudos e deixar a distorção mais definida e articulada mesmo no captador de braço e, por isso, não adicionei nenhum. Pretendo tratar o timbre com a minha gear e, se por algum motivo for necessário adicioná-lo, tem um espaço sobrando. Também vale lembrar que a captação é passiva, mas tem um circuito ativo feito sob medida cuidando de tudo. (nota: a foto ao lado é meramente ilustrativa e eu posto a placa definitiva assim que estiver pronta.)

Parte Elétrica Digital:
Como eu estou deixando o melhor pro fim, antes de falar do STG-O.S., vou falar do sensor de proximidade e do IMU, os quais são lidos e interpretados por ele para fazer algumas coisas legais. Quem conhece a linha de pedais da Zvex sabe que o Wah Probe e o Fuzz Probe têm um controle de expressão que usa a distância do pé para mudar a intensidade. Alguns teclados também contam com um sistema parecido (controlado pela mão do músico) e é exatamente o que eu faço aqui. Aproximando e afastando a mão desse ponto da guitarra, é possível controlar qualquer coisa via MIDI.
A sigla IMU é de "Unidade de medição inercial", um conjunto de acelerômetro e giroscópio com 3 eixos cada. O primeiro, mede aceleração linear e, o segundo, a angular, para que os dados sejam processados e o microcontrolador identifique a velocidade, orientação e forças G agindo sobre o objeto. Essa tecnologia, que já foi usada para estabilizar foguetes e navegar mísseis teleguiados, agora, permite que essa guitarra controle volume, wah-wah ou qualquer outra coisa baseado na posição em que ela está ou na forma como é acelerada, balançada ou coisa do tipo. Bem experimental: ainda precisa de testes.

STG-O.S.
Siglas óbvias para "Sharp Trickster Guitar Operational System". Eu acompanhei alguns guitarristas como o Mathew Bellamy, do MUSE, instalarem um Kaoss Pad nas suas guitarras (foto ao lado) e até escrevi um artigo a respeito aqui no blog também. Apesar de achar fantástico, eu imaginava levar a ideia ao próximo nível. Uma tela de LCD com Touch Screen poderia fazer a função de detecção e um microcontrolador converteria em valores MIDI para as coordenadas X e Y, como um Kaoss Pad. Ela também poderia ter essa função e controlar o meu set, e exibir, ao invés de luzes coloridas, valores coerentes, gráficos e o que mais eu quisesse dela: desde que escrevesse um sistema operacional próprio. Desafio aceito!

Recursos atuais:
- Rig Mode: Dispõe na tela 10 pedais + 5 footswitches para controlar via MIDI o ON/OFF de pedais e efeitos, o canal de amplificador e outros parâmetros em VSTs como Guitar Rig, Amplitube e outros, ou até mesmo equipamento físico em racks.
- XY TrackPad: A superfície touch detecta o local onde você toca para determinar as coordenadas em um plano cartesiano e, tomando como referência os eixos X e Y, fornecer dois valores CC no padrão MIDI. É uma função comparável a dois pedais de expressão controlados simultaneamente.
- Function Generator: Essa função é um experimento. Na tela um osciloscópio monitora o nível de um comando CC como um sinal e alguns botões permitem que diferentes funções sejam geradas (quadrada, triangular, senoide...) enquanto outros botões permitem que você mude a taxa de amostragem, bem como a frequência do sinal. A ideia é ter um LFO virtual para controlar wah-wahs, pitch shifters e outros de maneira rítmica e ajustável em tempo real.
-Piano Keys: Acredito que vai bem para controlar a tonalidade de um bass synth ou de uma track sobre a qual você está tocando, causando mudanças em tempo real. Dentro da limitação de ter de usar a mão que palheta para tocar as teclas do piano, essa é a utilidade que eu vejo. Contudo, é possível usá-lo para tocar passagens inteiras (talvez até simultaneamente, se a coordenação permitir) se assim for programado no VST ou rack com o qual ele se comunica.



Recursos futuros:
Como anteriormente dito, até um case muito especial está sendo feito sob medida para essa guitarra (mais sobre isso em um próximo artigo). O sistema operacional também vai receber novas funções: será reescrito e aprimorado muitas vezes antes de se tornar uma versão definitiva.
 Uma experiência futura é integrar o sistema analógico ao digital no nível de audio. Ainda preciso encontrar uma maneira de diminuir a latência para DSP, mas imagino novas funções como, por exemplo, transformar um audio capturado da guitarra em informação MIDI (como os GR da Roland). Talvez criar outra função experimental para reinjetar frequências iguais, oitavadas e harmônicos gerados pelo sistema digital no sustainer, de maneira a vibrar as cordas com um sinal eletrônico.
Novamente, convido-os a acompanhar o desenvolvimento do projeto e a participar, me enviando sugestões para implementar coisas novas no STG-OS. Se você imagina uma utilidade, um uso interessante ou mesmo uma função "just because", por favor deixe um comentário. Se você gostaria de patrocinar o próximo projeto, seja financeiramente, seja com peças e/ou serviços, sua ajuda também é bem vinda. Se você é dono ou conhece algum veículos de comunicação que poderia se interessar em divulga-lo depois de concluído, eu ficarei feliz em dar maiores detalhes e material.

2 comentários:

  1. Olá. Muito interessante seu projeto.

    Eu havia imaginado anteriormente algo mais simples, inspirado nas guitarras "muiti-timbre" da Roland e Gibson. O problema dessas guitarras é que funcionam com uma ponte piezoelétrica ligada a um sistema baseado em Midi, que traz o inconveniente de não permitir a utilização de "palm mutting".

    Pensei em usar um sistema de equalização digital compacto nos seguintes moldes:
    Captador magnético normal => Identificação de Frequências, volumes e harmônicos típicos do captador em uso => Ajustes desses valores para outros, baseados em captadores famosos.

    Obviamente, ainda não considerei influências das madeiras, cortes, modelos e hardwares no timbre. Apenas o captador.

    Até então, o sistema poderia ser baseado em um circuito ativo entre o captador e a instalação normal da guitarra (tone, volume, etc.), com as possíveis características:
    - Banco de dados com os padrões harmônicos de captadores famosos
    - Circuito EQ para várias bandas com potenciômetros digitais
    - Controlador PIC (ou outro tipo) para controlar esses potenciômetros digitais

    A leitura do padrão do captador em uso poderia ser feita, talvez, induzindo um campo magnético no campo de ação desse captador, simulando uma variação de 0Hz a 20kHz, registrando os níveis de saída para posterior programação, via software, das compensações para se chegar aos valores dos outros captadores (que passariam pelo mesmo tipo de leitura para registro). Para facilitar, seria necessário encontrar/produzir um captador com configuração o mais "flat" possível.

    Aparentemente essa ideia tem uma limitação: cada circuito só suporta um captador por vez. Assim, uma guitarra com três captadores precisaria de três sistemas iguais, rodando junto. Isso é um ponto negativo.

    A interface poderia ser extremamente simples, contando apenas com um display digital de led com 2 caracteres, que permitiria selecionar entre até 100 configurações distintas, organizadas numericamente; e mais 3 botões (bypass, avançar e voltar).

    O aparelho poderia conter embutido em si, um sistema para programar o PIC e carregar os sets via USB. Assim, abre a possibilidade para a criação de um software para configuração e atualização do banco de dados do dispositivo.

    Posteriormente, se der certo, pode-se pensar em como viabilizar esse sistema para guitarras com mais de um captador, já que são comuns no mercado guitarras com 2 ou 3.

    A intensão não é reproduzir com total fidelidade os timbres icônicos de captadores que marcaram história. É permitir que o guitarrista possa ter experiências distintas com a mesma guitarra, mais para diversão do que para uso profissional.

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    1. Eu vi o seu projeto, interessante também.
      Ainda sim você precisaria de um DSP pesado para conseguir esses efeitos, apenas variando a indutância e capacitância externamente como apontam os circuitos desenhados pela Muzique eu não acredito que você consiga modificar a curva característica dos captadores de maneira tão drástica.
      Mas eu ficaria contente em ver seu projeto funcionando, a minha sugestão no entanto seria para usar filtros ativos, uma vez que você já está usando energia para alimentar a parte digital.

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